Que História É Essa de Pós-MPB?

Entender o som feito hoje no Brasil é mais fácil do que parece

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Poucas palavras comunicam tão pouco quanto o termo “MPB”. Se formos ver ao pé da letra, seria uma produção musical não-erudita feita no Brasil, certo? E se esse conceito é abrangente demais aos seus olhos, saiba que é por isso que o uso da sigla comunica cada vez menos.

O curioso é que parece que são poucos os brasileiros que não entenderiam se alguém falasse sobre MPB, mesmo se só uma pequena parcela consiga (ou ouse) explicar. Pode ter casos de bandas que uns chamam de Rock ou Pop e outros enquadrariam como música popupar brasileira, então fica definido que é aquilo que é mais propriamente tupiniquim (ou seja, não seria feito em outro lugar no mundo) que ganha esse termo. Ainda assim, há controvérsias.

E de um tempo pra cá, um outro termo surge de vez em quando (seja em resenhas ou playlists) e, antes que ele comece a gerar mais dúvidas do que explicações, é melhor tocarmos no assunto. Curiosamente, é bem mais fácil falar de Pós-MPB. Como todo estilo com o prefixo “pós”, ele indica uma nova direção tomada pela linguagem musical que não seria possível se uma estética anterior não fosse estabelecida. Mas não é estranho imaginar um estilo baseado nas conquistas de um outro que parece ter mais dúvidas que respostas?

Acontece que Pós-MPB me parece muito mais uma situação, um contexto, do que um subgênero da música popular como um todo. Ele compreende sim o que se entende por MPB, porém deixa claro justamente a falta de significado que o tema carrega hoje.

E a melhor maneira de entender o que isso tudo quer dizer talvez seja ver algumas das heranças que a nova classificação pegou de seu antecessor. Perceba que, por mais que as características sejam as mesmas, a maneira de trabalhá-las revela a maturidade que só o tempo consegue trazer.

Engajamento Cultural

Lembra quando Los Hermanos fez uma mistura de vertentes do Rock com influências de Samba e Bossa Nova? Décadas antes, Novos Baianos e Os Mutantes já defendiam com todos os Tropicalistas sobre um som brasileiro feito com guitarras elétricas. E muito antes disso, em 1922, os Modernistas falavam da “antropofagia”, de digerir o que vem de fora e criar algo novo, algo nosso. Cultura brasileira é isso aí.

E isso se propaga em nossa música, esse costume de trazer elementos praticamente folclóricos ou tradicionais e colocá-los nesse liquidificador com a vida que levamos hoje no país – senão um paraíso tropical, a selva de pedra das metrópoles. Isso sim é relevante.

Prepare-se pra identificar elementos do nosso dia a dia e do linguajar popular nessas músicas.

Romantismo x Concretismo

Tenho a impressão que a lírica de hoje em dia tem forte influência de duas tendências bem distintas, uma mais romântica e outra mais concreta – às vezes na mesma canção.

A primeira é aquela que idealiza pessoas, lugares, outras épocas e, sim, os sentimentos. Espere muitas saudades e carinho, assim como um resgate às canções populares e românticas – em outras palavras, o “brega”.

Por outro lado, há uma grande ênfase no uso das palavras, principalmente nos significados que meros e cotidianos substantivos podem carregar, quanto na dificuldade de musicar uma língua com palavras tão grandes como a nossa, com tantos polissílabos que desafiam qualquer métrica.

Percussões e Harmonias

O Samba é o pai de todos os estilos brasileiros e está sempre, de alguma forma, ligado à música de hoje (seria a MPB “Pós-Samba” por excelência?). Antes disso, inclusive, deu vida à Bossa Nova, que deixou seus acordes dissonantes impressos em grande parte do que fazemos.

Assim como o Samba, muito da nossa música tem uma forte presença de percussão, seja de instrumentos acústicos ou, mais recentemente, dos eletrônicos. Da Bossa Nova, veio ainda uma busca por harmonias, vindas principalmente dos grupos vocais e duetos que marcaram o estilo em seus tempos áureos.

Todas essas músicas (e qualquer outra que tenha te vindo à mente enquanto você lia) tem duas coisas em comum. A primeira é que elas podem ser chamadas de diversas coisas, sendo que MPB é apenas uma delas. Por isso disse que o Pós-MPB é mais uma situação do que uma classificação de estilo.

A segunda é um apelo popular natural que elas tem, já que retratam nosso tempo e, de certa forma – e em maior ou menor grau, dependendo da faixa – quem nós somos. São referências que te lembram das músicas que cresceu ouvindo (mesmo sem ter notado) e das coisas que estão ao nosso redor, por mais internacionalizada que sua vida seja.

Recentemente, a catora Monica Salmaso disse em entrevista que “a MPB está pobre”, o que causou uma certa comoção em diversas pessoas perto de mim. Preciso, contudo, dizer que ela não está completamente errada. Se algum artista hoje quer tentar de alguma forma entrar nessa de fazer música popular brasileira e querer ser visto como alguém que só possui essa definição, seu trabalho dificilmente será de muito valor.

Aqueles que aprendem com a tradição e usam o que já foi feito como combustível para criar lgo do nosso tempo, porém, esses são os dignos de nossos ouvidos. Quem se interessar a conhecer as novas bandas não negará – ainda que precise de muitas palavras para explicar aquilo que escuta, já que três letras só nunca bastarão.

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Autor:

Comunicador, arteiro, crítico e cafeínado.