Um Novo Roger Waters?

Álbum solo do veterano baixista e líder do grupo Pink Floyd tem produção de Nigel Godrich

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Depois de 25 anos, Roger Waters, mais conhecido como baixista e vocalista de Pink Floyd, vem aí com um disco de inéditas. Da última vez que isso aconteceu, Amused To Death, viria a se tornar o terceiro álbum solo de Waters, numa carreira episódica e bem menos inspirada que sua trajetória à frente do Floyd. Várias questões surgem deste movimento do veterano músico inglês, ainda mais se levarmos em conta que ele contratou Nigel Godrich para produzir e participar do álbum, que vai se chamar Is This The Life We Really Want? e deve ser lançado no início de junho. Conhecido por ser o “sexto Radiohead”, responsável pela sonoridade da banda de Thom Yorke pós-OK Computer, Godrich é, além de um produtor, uma grife e uma declaração de intenções. No caso de Waters, o movimento significa modernização.

A verdade cruel é que poucas pessoas, além dos fãs mais ferrenhos da música de Pink Floyd desejam saber realmente o que Waters pensa ou faz como artista solo e ele sabe bem disso. Tanto que investiu nos últimos anos em projetos que revivessem suas obras à frente de sua antiga banda, seja em turnês que revisitavam velhos hits, como In The Flesh, que veio ao Brasil logo na virada do milênio quanto o recente projeto The Wall, que reviveu o célebre álbum duplo de 1979, com direito a lançamento de CD/DVD/Blu-Ray das apresentações e um documentário grandioso sobre a vida de Roger, sua relação com o pai e a Inglaterra do pós-guerra, desde sempre as duas forças propulsoras de sua inspiração como artista. Agora, com 73 anos, parece pouco provável que ele tenha algo novo a dizer.

Surpresa! Ele tem. Na verdade, o mundo dá a Waters vários motivos para sair de sua confortável aposentadoria e se arriscar a compor canções novas. Sair em turnês nós já sabemos que ele sai, porém, expor sua verve de old timer é algo que não é tão usual assim. A atualidade dá a ele os motivos suficientes para ter algo a dizer. Desde sempre, mais precisamente, desde que assumiu a liderança do Pink Floyd após a saída de Syd Barret, em 1968, Waters gestou uma personalidade monolítica para os companheiros de grupo, impondo diretrizes e liderando as ações, mas, por outro lado, deu vazão a um lado cronista/ativista da realidade muito importante. Dessa visão crítica do cotidiano vieram discos como Dark Side Of The Moon (1973) ou o cruelmente subestimado Animals (1977), nos quais, além do já mencionado The Wall, Waters tece comentários relevantes sobre modernidade vazia, distopia, desumanidade, crueldade, hipocrisia e fascismo. É até engraçado notar como pode haver gente com pensamentos conservadores que engrossa as fileiras de um artista tão progressista e participativo das questões mundiais. Mas, enfim, é a vida…

Sendo assim, é muito provável que as doze canções já anunciadas contenham preciosas observações de um Waters rabugento, porém, jamais conservador e fechado para o que realmente importa. A novidade, no entanto, é a presença de Godrich no comando do estúdio. Na verdade, o movimento de Roger nem é tão novo se pensarmos que Godrich foi bem requisitado após produzir O.K Computer em 1998 e assumir o posto fixo de produtor dos outros álbuns de Radiohead. Desde então já foram sete discos, que sempre mantiveram o interesse na banda intacto e conservaram sua total sintonia com a contemporaneidade. Além de Yorke e seus amigos, Godrich também foi requisitado por gente como Beck, para quem produziu um de seus melhores trabalhos, o sensacional Sea Changes; U2 e até Paul McCartney, dividindo os trabalhos e dando um belo banho de século 21 nas gravações do ótimo Chaos And Creation In The Backyard, de 2005.

A julgar pela primeira canção revelada, Smell The Roses, Roger Waters parece conservador e a produção surge totalmente voltada para a recuperação de uma sonoridade Rock velha, padrão anos 1970, típica de velhos lobos estradeiros e calejados. Bem, este é o padrão de Roger enquanto artista solo, mas fica a expectativa de uma investidura maior no terreno similar ao que ele explorou em momentos audaciosos à frente do Floyd ou mesmo que ele – aí já é querer demais – busque o equivalente de 2017 para o que significava afrontar os signos do poder em 1973. Se ele conseguir algo parecido em alguma canção deste álbum, talvez arranhe as listas de melhores do ano. Do contrário, infelizmente, os fãs só irão aos shows para ouvir os sucessos de quando Waters tinha seus 30 e poucos anos de idade. Coisa que aconteceu há bastante tempo. Torçamos.

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Autor:

Carioca, rubro-negro, jornalista e historiador. Acha que o mundo acabou no meio da década de 1990 e ninguém notou. Escreve sobre música e cultura pop em geral. É fã de música de verdade, feita por gente de verdade e acredita que as porradas da vida são essenciais para a arte.