Death Cab For Cutie: Por Hoje, Já Valeu

“Thank You for Today”, novo álbum do grupo sai nesta sexta, 17

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Há poucos dias, Thank You For Today, novo álbum de Death Cab For Cutie, teve seu streaming liberado. Coisas de Internet que a gente adora. Quando este artigo foi encomendado, o disco era apenas um exercício de adivinhação, no qual três músicas lançadas previamente surgiam como elementos para facilitar as elocubrações acerca do que poderíamos esperar de Ben Gibbard, o cérebro pensante da banda, neste novíssimo trabalho. Desta forma, escreverei um texto coerente com meus pensamentos sobre como deve estar a nova encarnação do grupo (que é, basicamente, um veículo para Gibbard experessar-se) e voltarei mais tarde, com a resenha formal do disco, proporcionando uma interessante – acho – brincadeira de antes/depois.

Gibbard, os fãs sabem bem, é o que Renato Russo chamava de “animal emocional”. A trajetória de sua banda mostra isso, com especial apreço pelas canções tristonhas, depressivas, autocomiserativas. É aquele tipo de pessoa que enxerga na tristeza a possibilidade de exorcizar demônios ou que vê um fluxo ininterrupto de criatividade surgir, aos borbotões, quando não tem coragem nem de se olhar no espelho. Assim como Gibbard, todos nós temos fases em que estamos assim, uns mais que os outros, certo? Ao longo da vida, jovens, velhos, levamos as cacetadas protocolares, crescemos, sofremos e mudamos. Pois a discografia de Death Cab For Cutie também mostra isso. Os primeiros álbuns são mais intensos, no sentido “jovem se descobrindo”, depois, a partir da dobradinha Transatlancism/Plans, lançada entre 2003 e 2005, Gibbard e Chris Walla, guitarrista, produtor e ex-integrante do grupo, forjaram um paralelo de simplicidade melódica, referências oitentistas e sensibilidade alternativa que se tornou uma espécie de padrão a ser seguido. Dez anos depois veio Kintsugi, o disco mais recente, o primeiro sem Walla e que mostrou que Gibbard estava se adaptando ao novo momento, personificado na chegada dos 40 anos, um divórcio sofrido e na partida do ex-integrante/fundador do Death Cab For Cutie.

Tudo isso faz de Thank You For Today o iminente retrato de um Gibbard quarentão, supostamente cicatrizado e pronto para novo atestado de vida. O agravante da chegada de Trump ao poder é algo a ser considerado, porém, acho que a maior e mais eficaz declaração feita sobre como é o novo disco foi dada de uma forma, digamos, pouco convencional. Os fãs sabem que Ben é um fã confesso do grupo escocês Teenage Fanclub, assim como a maioria das pessoas de bom coração. No ano passado, ele regravou o segundo álbum dos caras, o épico Bandwagonesque, lançado em 1991, o qual Gibbard diz tratar-se de seu disco preferido. Quem não conhece o original precisa parar de ler aqui e caçar o álbum para ouvir. É uma adorável sequência de canções enguitarradas sobre amor, desajustamento, relacionamentos, enfim, tudo o que realmente importa nessa vida e que norteou os passos do jovem Ben lá em Seattle, na virada daquela década de 1990. Com versões entre a fidelidade absoluta e alguns vôos surpreendentes, o disco foi relido e relançado em tiragem curtíssima de vinil, porém chegou com gentileza aos serviços de streaming.

Gibbard deu várias entrevistas na época, explicando sua escolha e seu movimento de evocar o disco em uma regravação completa. Basicamente disse o que falamos acima, sobre emoção, sentimento e o efeito das canções sobre ele. Também falou sobre a fidelidade do artista com sua banda e sua missão de encontrar nas pessoas toda comunhão possível e promover uma espécie de transformação mútua entre audiência e artista. Criticou bandas “carreiristas” e tudo mais. Também cravou a descrença sobre o futuro imediato de seu país com Trump na presidência. Cerca de um ano depois começaram a vir as primeiras especulações sobre o novo disco de Death Cab e logo chegou o primeiro single: a ótima Gold Rush. Depois chegaram I Dreamt We Spoke Again e Autumn Love. Cada uma a seu jeito, as canções encapsulam estes pilares que sustentam a obra do grupo: rock alternativo em sua essência; emoção/sentimento e intensidade emocional. Não veremos um disco de Gibbard no qual ele surja burocrático ou protocolar. Ele sempre virá acreditando que está fazendo o máximo, por si e pelos fãs. E isso é ótimo.

As três já são prediletas: Gold Rush tem uma alma eletrônica de teclados que surgem como chuva de todos os lados, melodia cristalina e uma vocação remixante que já se revelou no bela releitura que está no Spotify com o nome de Trooko Remix. Outra querida da casa é Autumn Love, que tem potencial para ser cantada junto, instrumental enxuto, guitarras harmoniosas e volumosas, mixagem fluida. A belezura que é I Dream We Spoke Again salta aos olhos. É uma espécie de canção de New Order que tenta voltar pra casa mas não sabe direito como fazer. Tem loops de bateria, teclados onicientes e uma inequívoca guitarra com timbre decalcado que fará os fãs das duas bandas sorrirem e se abraçarem.

Dito tudo isso, meus caros e caras. Passarei oficialmente à audição do álbum e volto com a resenha em alguns dias para confirmar esse exercício de adivinhação calculada. Espero que as boas impressões se confirmem. Té já.

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Autor:

Carioca, rubro-negro, jornalista e historiador. Acha que o mundo acabou no meio da década de 1990 e ninguém notou. Escreve sobre música e cultura pop em geral. É fã de música de verdade, feita por gente de verdade e acredita que as porradas da vida são essenciais para a arte.