Os 25 Anos de “Green”

Comemoramos o aniversário do primeiro disco do R.E.M. em uma grande gravadora, provando para todos que isso não influenciaria a inventividade ímpar da banda

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Onde você estava em 1988? Eu estava em alguma loja de discos de Copacabana, Rio de Janeiro, comprando discos. Entre eles, claro, o sexto álbum do REM, Green. Era o primeiro trabalho da banda de Athens a ser lançado por uma gravadora major, no caso, a Warner. Isso mesmo, pessoal, o R.E.M. precisou gramar cinco discos e cerca de cinco anos, entre as fileiras independentes da IRS até assinar um contrato polpudo com uma gravadora maior. Lembram das palavras “independente” e “alternativo”, certo? Nesses tempos elas ainda valiam algo e não eram partes de frases de efeitos na boca de executivos e ouvintes leite com pera. Nos 80’s, ser independente significava perrengue master e o R.E.M. em 1988 era uma banda forjada na estrada e na confecção de discos maravilhosos.

Green, o debut na Warner, nunca foi dos meus trabalhos preferidos na lavra do REM. Achava que o disco era polido demais e simplesmente não engoli o sucesso de uma canção como Stand, que veio anunciando a nova empreitada. Essa sensação durou até o dia em que comprei o LP, quando a audição de Orange Crush teve lugar e desfez qualquer sombra de medo que eu pudesse sentir pela “venda” da banda para uma multinacional. Sim, também tinha dessas: ir para a Warner e abraçar cifrões, poderia significar uma maciez musical que seria a derrota do R.E.M., isso, claro, na cabeça de seus fãs mais malucos (eu incluído), o que Orange Crush, definitivamente, deixava de lado. A força da voz de Michael Stipe, tão querida pela dissertação enlouquecida que promovera em It’s The End Of The World As We Know It (And I Feel Fine) pouco mais de um ano antes, mostrava aqui sua ferocidade. Não era em Stand e seu clipe de dancinha colorida que o R.E.M. iria encontrar sua razão de ser nesses novos tempos, ainda que, três anos depois, a aparição de Losing My Religion e Shinny Happy People, puxando o sucessor de Green, Out Of Time, insistissem em lançar sombras sobre essa conclusão. Orange Crush e Get Up (em menor escala) eram certezas da manutenção da ordem.

O R.E.M. de 1988 ainda era uma banda com muito a aprender. Sua sonoridade estava mudando. Deixava a interessante liga que misturava Punk, Country e Byrds e partia em direção a uma sonoridade extremamente pessoal, cortesia não só dos vocais ininteligíveis de Stipe, mas pelos backings de Mike Mills e Peter Buck, além da bateria simples e precisa de Bill Berry. Sim, o R.E.M. como quarteto, na flor da idade. Essa era a banda que a Warner abiscoitara e que apontava um caminho que outro baluarte do Rock independente seguiria quase simultaneamente: O Sonic Youth, que assinara com a Geffen Records para o lançamento de seu Daydream Nation, no mesmíssimo 1988. Era um sintoma que não poderia passar em branco.

Os vinte e cinco anos de Green são celebrados por seu relançamento em versão dupla, trazendo o disco remasterizado sem faixas-extras de qualquer natureza, uma pisada na bola da Warner, que deixou de fora lados-B e versões instrumentais das canções. Por outro lado, abriu o baú e colocou no segundo disco um concerto do REM em novembro de 1989, praticamente um ano após o lançamento de Green, em Greensboro, Carolina do Norte, com 21 músicas. Parte desse show já aparecera no home video da banda Tourfilm, lançado em 1990. Aqui ele está completo e majestoso, como deve ser. Além de sucessos do novo disco, como Orange Crush, Stand, Pop Song 89, a banda executa cheia de energia e competência seus pequenos clássicos como Fall On Me, Exuming McCarty, Finest Worksong, Cuyahoga, It’s The End…, além de testar novas composições como Low e Belong, que estariam em Out Of Time.

Olhar para esse intervalo de 25 anos é interessante, principalmente pela constatação de tantas mudanças, cujas sementes já estavam plantadas naquele 1988. Sobretudo, é complicado e nostálgico olhar para um mundo distante um quarto de século no passado e notar que várias coisas interessantes ainda povoavam seu cotidiano de 18 anos de idade, principalmente este evento imemorial e saudoso que era correr para uma loja de discos e trazer pra casa o “novo do REM”. Este gesto se repetiu muitas vezes até o fim da banda e era sempre uma maneira de entrar em contato com uma reserva moral musical de alguma espécie, provida pela banda, por sua integridade, seriedade e grande capacidade de fazer músicas belas e importantes. Que nos restem os jubileus para celebrarmos. Rapazes, vocês fazem falta.

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ARTISTA: R.E.M.
MARCADORES: Aniversário

Autor:

Carioca, rubro-negro, jornalista e historiador. Acha que o mundo acabou no meio da década de 1990 e ninguém notou. Escreve sobre música e cultura pop em geral. É fã de música de verdade, feita por gente de verdade e acredita que as porradas da vida são essenciais para a arte.