Eu tenho a teoria que a boa música instrumental é aquela que permite o ouvinte criar suas próprias histórias, “colocar uma letra” na faixa. Essa maior subjetividade na própria apreciação aumenta, por assim dizer, seu contato com a obra, transformando o ouvinte também em uma parte da ativa dela. Sei que pode parecer utópico pensar assim, mas acredito que mais gente, além de mim, também experimenta a música instrumental dessa maneira.
Saindo agora dessa pequena divagação, vamos ao que interessa: essa incrível faixa do renomado e, entretanto, desconhecido Kamasi Washington. O cara já tem pelo menos uns dez anos de carreira e parcerias com grandes nomes atuais ,como Thudercat e Flying Lotus, mas creio que ainda permaneça nas sombras para muita gente que não tem contato direto com Jazz contemporâneo.
Sei que o Jazz não é lá um dos gêneros mais fáceis de se envolver, mas se você já teve contato com seus dois colaboradores anteriormente, vai sentir que sentir que a música de Kamasi ao mesmo tempo que projeta intersecções com estes nomes, foge também das comparações dos estilos mais pessoais deles, seja pela eficiência de Stephen Bruner ou pela amarra eletrônica de Steven Ellison. Washington tem um estilo mais ligado do Free Jazz e Avant-Garde Jazz, mais próximo de grandes lendas, como John Coltrane, Ornette Coleman e Albert Ayler.
Re Run Home é a primeira amostra de uma nova fase do músico, agora como parte do selo Brainfeeder, comandado por ninguém menos que Flying Lotus. Mostrando uma ambição ímpar, o músico lançou uma faixa com mais de quatorze minutos, uma epopéia sonora que mostra boa parte do seu arsenal musical. Não só sua habilidade ao saxofone (seu principal instrumento), mas também como compositor e arranjador. Ao longo do música, Kamasi brinca com variados estilos na percussão, com o timbres leves do piano, um baixo que pode lembrar em alguns momentos a fase Funk de Herbie Hancock (com quem Washington já trabalhou) e uma progressão em sua estrutura que é de deixar o queixo caído.
Kamasi Washington – Re Run Home
Essa ambição não para por aí. O músico lançará em 5 de maio seu primeiro disco pelo novo selo, sendo uma obra composta por três discos e que ultrapassa a marca dos 172 minutos. Kamasi ainda conta com a ajuda de uma orquestra de 32 músicos e um coral com mais de 20 vozes. O nome do álbum não poderia ser melhor escolhido: The Epic.
