Se a música serve como transmissor de sentimentos e pensamentos de um compositor, China leva esta noção ao extremo em seu novo disco Telemática. Famoso por ter apresentado em 2011 o ótimo Moto Contínuo, o compositor retorna com um álbum que mostra os diferentes “eus” que existem dentro dele. Uma espécie de disco auto-investigativo, mas, ao mesmo tempo, que procura mostrar que China não é um músico no sentido de se limitar um gênero para expressar seus ideias mas sim, usar tudo o que for possível para melhor traduzir o mundo que se encontra dentro de sua cabeça.
Precedido por uma frase de Otto Lara Resende sobre o crescente número de prédios no Rio de Janeiro nos anos 70, China abre o disco nos jogando de cara que “Recife alcança um céu de concreto armado…”. Com um Rock constante e firme, o compositor mostra uma preocupação com temas modernos e urbanos, sendo a cidade o pano de fundo que move seus questionamentos. Céu de Brasília enumera uma série de elementos da cidade, mas não deixa de elogiá-la. É deste questionamento e alternância entre o crítico e a contemplação que percebemos uma relação muito sincera de China para com o seu ouvinte, como se nós (que vivemos em cidades) soubéssemos das impressões do músico.
Ainda que o urbano exerça admiração por parte dele, o compositor entende que ainda sim é humano e, por vezes trata de temas mais subjetivos e pessoais. Outra Coisa é uma das melhores músicas do disco, abordando uma paixão com um refrão extremamente grudento e uma forma de dizer “eu te amo” que só o sotaque nordestino consegue fazer. Sobre mudanças e humanidade, China nos apresenta Panorama, uma música que, segundo ele, foi feita evocando referências da Jovem Guarda (um ótimo período, considerando a proposta pessoal do compositor).
Após apresentar a cidade e o morador, China nos introduz um novo tem que permeia sua cabeça: as relações de um para com o outro. A diferença de humores do ambiente e do indivíduo são expressas de forma sincera e depressiva em Frevo Morgado, um momento no disco que revela o talento de China como produtor e intérprete ao mesmo tempo. A tecnologia é algo recorrente nesta relação, produzindo ótimas faixas como Telemática e Choque Pesadelo, a qual foi inspirada pelo diálogo que o compositor teve com o ex-VJ da MTV, PC Siqueira, sobre a divisão de vida real e virtual.
Desta forma, China nos mostra os pequenos “chininhas” que existem dentro dele. A relação para com o ouvinte é quase imediata, pois ele aborda temas muito honestos e cotidianos da vida de um morador urbano, como se fosse um texto muito bem escrito.
Um disco que revela o talento de China para escrever crônicas musicais hiperrealistas.