Chegar ao segundo álbum é também ter a oportunidade para um artista investir suas fichas nas características que percebeu serem melhores, uma percepção difícil na estreia. Quem já viu Ian Ramil ao vivo sabe a força que tem sua interpretação, algo que aparecia em menor escala em seu primeiro registro, Ian.
Derivacilivização encontrou o formato ideal para que o músico gaúcho explorasse ainda mais seu potencial em composições que resumem o espírito de inevitável revolta das mentes atentas aos problemas sócio-culturais que o Brasil enfrenta hoje em dia.
Coquetel Molotov, a primeira música do disco a ser mostrada, abre o álbum com a mesma força que um título desses carrega e os impulsos naturais das emoções como raiva, frustração e desesperança como guia. É como se o lado mais animal do ser humano ficasse mais evidente após a racionalização que compreende problemas muito maiores do que suas soluções.
Corpo Vazio, Salvo-Conduto, Não Vou Ser Chão pros Teus Pés e Artigo 5º continuam esse clima, cada uma a seu modo, de lamentar feridas cutucadas e a exposição dos problemas de forma sempre emocional, o que fica muito bem na voz grava de Ian – e o contraste com o vocal de Filipe Catto na faixa-título deixa tudo ainda mais interessante.
Antes do fim, A Voz da Indústria é o momento do disco em que o mercado fonográfico é cutucado com vara curta e Devagarinho vem como momento mais humano e carinhoso da obra, – dois capítulos que dão um fôlego ainda maior para a obra como um todo.
As músicas soam como resultados de experimentações em estúdio com sua (excelente) banda em uma sonoridade direta e sempre urgente – em certos momentos, parece até que as faixas foram gravadas ao vivo. E tudo isso funciona em função da interpretação sempre potente de Ian Ramil, que dá seu recado com clareza e, repare, boa sensibilidade nas entrelinhas de quem canta cansado da situação e disposto a mudá-la.