Resenhas

De La Soul – and the Anonymous Nobody…

Esperado retorno do trio de Hip Hop é porta de entrada para quem desconhece sua discografia

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Ano: 2016
Selo: A.O.I. Records
# Faixas: 17
Estilos: Hip Hop
Duração: 68:00
Nota: 4.0
Produção: De La Soul

É curioso perceber que, em tempos de amplificação de bancos de dados e extensões quase reais da memória através da Internet, o som de De La Soul permanece tão “desconhecido” pelas novas gerações de fãs de Hip Hop. Não que a sua importância tenha sido esquecida; mencionar o nome do famoso grupo formado por Posdnuos, Dave e Maseo proporciona o mesmo respeito de dinossauros tais quais Mos Def, Tupac ou Notorious. No entanto, suas obras permanecem em um limbo difícil de entender na atualidade.

Vítima de sua própria genialidade ao definir e propagar a ideia de utilização criativa e inovadora de samples em seu debut 3 Feet High and Rising, o grupo não tem a maioria de suas obras publicadas em serviços de streaming ou disponíveis para compra. YouTube, um torrent com todas as obras disponibilizadas gratuitamente pelo grupo ou reedições de vinil permitem a perpetução de um dos nomes mais relevantes do Hip Hop de forma quase marginal.

and the Anonymous Nobody, projeto financiado com o apoio de fãs por financiamento coletivo, é o esperado lançamento que esperávamos do grupo, mesmo que seu retorno ao passado seja até um pouco excessivo em alguns momentos. Sua primeira obra em doze anos foi toda gravada em estúdio e os toques orgânicos de sua produção trazem de volta uma essência permitida em um gênero em que a nostalgia é quase encarada como preguiça.

O espiritualismo da obra, proporcionado pelo retorno desses dinossauros, é realçado por participações mais do que especiais de David Byrne, Estelle, Usher e Damon Albarn (um dos pilares que não deixou o grupo morrer por conta de suas participações conjuntas com Gorillaz), ou por títulos de faixas que mostram o quão importante é a sua volta – Genesis abre o disco, enquanto Exodus o encerra. Com mais de uma hora de duração, o álbum mostra que bastam alguns compassos de groove, como em Royalty Capes ou na maravilhosa Trainwreck, para ensinar a juventude a sua importância – suingues únicos que são quase estranhos ao Hip Hop atual, que parece se mover em outras velocidades. São as boas energias e os versos românticos que ganham força em nomes como Chance the Rapper, mas que surgiram tão naturais aqui pelos nomes envolvidos.

Os valores alcançados através do financiamento coletivo permitiram uma produção gigantesca e detalhista – Little Dragon surge na erudita Drawn, enquanto Byrne traz toques excêntricos à obra em Snoopies. Ambos mostram o controle que o trio teve ao longo de sua confecção; o resultado final é um disco que dificilmente teria espaço no auge da banda por trazer tantos toques foras da curva. Alguns, obviamente, são questionáveis como os infindáveis solos de guitarra na entendiante Lord Intended – interação de Rock que deveria ter permanecido como marca de Run DMC com Aerosmith – ou no Blues de CBGBS. Tudo bem, pois não faltam boas faixas em um trabalho com 17 canções.

A nostalgia por todos os lugares faz com que os melhores momentos nos façam relembrar as melhores batidas de De La Soul is Dead ou Stakes is High, clássicos que devem ser encontrados nos confins da Internet caso sejam desconhecidos pelo leitor. Pain, deliciosa faixa com Snoop Dog, convida aos passos de dança e ao êxtase em um clube cheio e Memory of…(US) com Estelle é o romance infinito em um das melhores faixas de R&B do ano, enquanto Nosed Up traz um sorriso ao rosto do mais velho fã do grupo. Temos ainda a bonita balada Greyhounds, que renasce Usher das cinzas, e o momento que não poderia faltar: Here in After com David Albarn, momento Indie que traz Gorillaz quase de volta após alguns anos; parceria que retornará no futuro novo disco do projeto.

Curiosamente, enquanto a essência lírica e atmosférica do grupo não se perdeu, a falta dos famosos samples traz um novo grupo à tona, mais maduro e coeso. Não se esperaria um trabalho longe de suas origens e o resultado final parece trazer novos fãs ao descobrimento de De La Soul e, ao mesmo tempo, emocionar fãs antigos. Se o gênero aqui parece tão jurássico, ele tem um motivo: a propagação mundial do Hip Hop de velha guarda como conhecemos ocorreu no final dos anos 1980 e teve os dedos, versos e batidas do trio.

Por isso, o lançamento de and the Anonymous Nobody…, primeira obra assinada pelo grupo em doze a,nos é tão importante: é o esperado retorno de um nome que se tornou underground em um mundo tecnológico porque, aparentemente, as grandes mídias ainda não conseguiram se adequar à disponibilização de royalties divididos a partir de samples. No futuro, os clássicos, quem sabe, poderão ser acessados no Spotify ou Apple Music. Por enquanto, Posdnuos, Maseo e Dave reescrevem sua história de forma digna.

(and the Anonymous Nobody… em uma faixa: Pain feat Snoop Dog)

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ARTISTA: De La Soul
MARCADORES: Hip Hop, Ouça

Autor:

Economista musical, viciado em games, filmes, astrofísica e arte em geral.