Resenhas

Merchandise – A Corpse Wired For Sound

Trio não convence ao trabalhar seu som acinzentado

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Ano: 2016
Selo: 4AD
# Faixas: 9
Estilos: Pós-Punk, Rock Alternativo, Pop Alternativo
Duração: 43:06
Nota: 2.5
Produção: Merchandise e Maurizio Baggio

Cá estou eu ouvindo o quarto trabalho do trio americano Merchandise, A Corpse Wired For Sound. Foi preciso meio acorde para sacar qual a onda dos caras: enveredar pelas alamedas cinzentas do Pós-Punk britânico dos anos 1980, tanto em sua cara inicial, de gente como Echo & The Bunnymen, como em sua forma mais para o fim da daquela década, daqueles precursores do Shoegaze, tipo My Bloody Valentine. Além disso, há certa semelhança com Interpol, bom representante, também norte-americano, desta estética cinzenta e triste, mas que soube imprimir alguma personalidade através do vigor baixo/bateria de suas canções e arranjo. O que sobra para Merchandise, então? Pouco.

Apesar de contar com outros três trabalhos na carreira e carregar o selo de qualidade da gravadora inglesa 4AD, o trio de Tampa, Flórida (lugar pouco provável para o surgimento de uma banda tão cinzenta), padece de um mal comum a vários artistas dos nossos tempos: a falta de boas canções. Não se trata de cobrar refrãos pop ou acenos a este ou aquele setor da música, mas de ouvir boas melodias e perceber artistas hábeis em dosar experimentalismo, liberdade de ação e o mínimo de preocupação com o prazer auricular do ouvinte. No caso de Merchandise, essa situação se repete e a banda, talvez involuntariamente, tenta confundir o ouvinte com doses de “estilo”, que são arremessadas sob a forma de longas canções, arranjos oscilando entre guitarras agudas, bateria quase eletrônica – tocada por um humano com pouca capacidade de variação – e um baixo quase inaudível que, juntos, entregam uma sonoridade estéril.

A rigor, o álbum tem apenas uma boa canção que escapa da lenga-lenga neo-gótica que o grupo se esforça em apresentar. A bela I Will Not Sleep Here é um bom exemplo do quanto a banda pode apresentar uma melodia triste, cinza – com um toque de Psicodelia noventista – sem chafurdar por pântanos imaginários de lentidão sem (ou com pouca) inspiração. Lá pelo último minuto, o arranjo inicial se dissipa e surgem guitarradas do bem, que preencherão o espaço até o minuto 6:46.

De resto, ignore as quatro primeiras faixas e vá direto a Lonesome Sound. Ela tem pouco mais de dois minutos e meio de um arranjo que insere timbres tecladeiros numa melodia simpática, mas que é engolfado por sussurros e murmúrios, levando tudo vai para o buraco. Silence é outro exemplo de busca por ares menos enfumaçados, que sucumbe novamente – e no mesmo ponto – à sanha murmurante e diminuidora de rotação que a banda impõe às suas pobres – e poucas – boas canções. O final, com My Dream Is Yours retoma o arrastar melódico e sua imersão em guitarras que nunca soam muito alto ou caóticas o suficiente para demonstrar algo, ainda que melhore sensivelmente a caminho do fim.

Merchandise é uma banda menor. Se eu fosse seu produtor, mandava os integrantes fazerem uma imersão nas obras das formações mencionadas lá no primeiro parágrafo, todas cheias de estilo e sintonizadas com seus tempos, mas que nunca abriram mão da premissa das boas canções como objetivo maior. Mesmo assim, há lampejos de que os caras sabem fazer a coisa, o que motiva a cotação esperançosa e otimista que daremos aqui. Vamos aguardar o próximo disco.

(A Corpse Wired For Sound em uma música: I Will Not Sleep Here)

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Autor:

Carioca, rubro-negro, jornalista e historiador. Acha que o mundo acabou no meio da década de 1990 e ninguém notou. Escreve sobre música e cultura pop em geral. É fã de música de verdade, feita por gente de verdade e acredita que as porradas da vida são essenciais para a arte.