Resenhas

Shamir – Revelations

Surto psicótico do artista gera obra para se pensar além das músicas

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Ano: 2017
Selo: Father/Daughter Records
# Faixas: 9
Estilos: Lo-Fi, Pop, Folk
Duração: 31:00
Nota: 3.5

Viver não é fácil e, para Shamir, os últimos anos foram especialmente difíceis. Apesar de seu disco de estreia, Ratchet, ter tido um sucesso indiscutível, a vida pessoal do jovem cantor e compositor foi marcada por episódios intensos que certamente mudaram suas perspectivas e pensamentos. Com o sucesso repentino, ele se viu questionando o curso que sua produção tomara. Era esse o som que queria produzir?

Ele queria mesmo ser um astro do Pop? Concomitante a isso, Shamir começou a sofrer crises de pânico e ansiedade que levaram a um caso de surto psicótico que o deixou internado por alguns dias. A forma que encontrou para lidar com esse caos interno foi a produção de Hope, um tímido registro lançado apenas via SoundCloud, gravado em um fim de semana. Agora, passado grande parte deste cenário intenso, Shamir regressa com algumas certezas importantes sobre sua vida.

Revelations é um disco com uma carga pessoa intensa e fantástica. Assinado com sua nova gravadora, Father/Daughter Records, Shamir parece ter deixado as batidas eletrônicas e a Dance Music oficialmente de lado, assumindo uma postura mais introspectiva e sincera diante de suas composições. Sonoramente, este disco lembra bastante Hope: timbres bastante digitais, um amadorismo Lo-fi proposital e, sua maior marca, letras que refletem tanto seus medos quanto suas descobertas.

É certamente chocante perceber uma mudança sonora tão brusca em tão pouco tempo, mas talvez esta seja justamente sua intenção: mostrar que os últimos anos foram decisivos e que ele jamais poderia ser o mesmo depois do que lhe aconteceu. Este é um trabalho, acima de tudo, corajoso, pois Shamir não tem como prioridade agradar o público, mas sim, a si mesmo – fato que torna seu trabalho extremamente sincero. Entramos em contato direto com o seu imaginário, e após todo que ele passou, ainda ter coragem de nos mostrar todo isso, é verdadeiramente desbravador.

Games, a faixa de abertura mostra o quão oposto Shamir se encontra em relação produção complexa de Ratchet, se sustentando com um piano elétrico texturizado e com melodias bastante dramáticas. O single 90’s Kids é tanto um chamado de atenção sobre a saúde mental dos jovens, quando um hino que celebra a derrota como parte integrante de nossas vidas. Blooming lembra um Pixies mais tímido, explorando um Lo-fi leve e uma temática romântica. Floar, por sua vez, parece ser uma combinação da acidez de Frankie Cosmos e da pegajosidade Pop de Taylor Swift. Astral Plane parece ser uma brincadeira inocente Pop e Dub que traz nos mostra o quão à vontade Shamir ficou ao gravar estas composições. Por fim, Straight Boy é a faixa definitiva que mostra tanto o grito de socorro e o convite à reflexão que nortearam os episódios marcante de Shamir.

Revelations é um diário que requer muito cuidado ao ser aberto. É muito provável que muitos encarem este disco como amador ou pouco inventivo. Mas, antes disso, precisamos entender que estamos diante de um material muito íntimo e que, embora não seja a produção mais elaborada e complexa de sua discografia, certamente traz uma reflexão sobre o poder da música na promoção de qualidade de saúde mental. Dessa forma, temos um disco para se pensar além das músicas.

(Revelations em uma faixa: Straight Boy)

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BOM PARA QUEM OUVE: Frankie Cosmos, Alex G, Pixies
ARTISTA: Shamir
MARCADORES: Folk, Lo-Fi, Ouça, Pop

Autor:

Produtor, pesquisador musical e entusiasta de um bom lounge chique