Resenhas

Natalie Prass – The Future And The Past

Cantora e compositora chega a uma maturidade precoce em seu segundo álbum

Loading

Ano: 2018
Selo: ATO
# Faixas: 12
Estilos: Pop Alternativo
Duração: 45:27
Nota: 4.5
Produção: Matthew E. White

Natalie Prass chegou a uma maturidade precoce com este segundo e excelente The Future And The Past. Pensando bem, esta pode ser uma frase para fechar esta resenha. Vamos começar de outro jeito: Natalie, 32 anos, encontrou um equilíbrio raro de se achar. Seu novo trabalho, o segundo de sua carreira, consegue juntar influências do Pop setentista com vestígios dos anos 1990, especialmente do R&B daquela década, que teve um papel decisivo na formação do gosto musical de muita gente que chega agora aos 30 anos. Natalie é dessa galera, que amou discos de Mariah Carey, En Vogue, TLC e Janet Jackson, mas cresceu em lares cujos pais eram adoradores de bandas como Fleetwood Mac. Já vimos essa combinação fazer muito sentido no trabalho de gente como as irmãs HAIM e tornar-se um caminho aprazível para prover de inspiração o novo Pop alternativo que vem sendo feito.

Seria impreciso dizer que o êxito do disco vem apenas de boas influências. Natalie é ótima cantora, produz e tem um parceiro de cabeceira: Matthew E. White, que co-assina várias faixas e toca vários instrumentos ao longo do disco. Além disso, a banda de apoio é formada por músicos do selo/coletivo Spacebomb, que já vem se destacando como preferida de muita gente para a gravação de álbuns com essa pegada duplamente retrô, que consegue, ao mesmo tempo, soar nova e novidadeira. Não espanta que os arranjos e instrumentais de The Future And The Past sejam tão ricos e precisos, incluindo cordas, metais, teclados, tudo com jeitão de produção luxuriante dos anos 1970, mas que soa fresca e novinha em folha. Com esses atributos, o disco soa como uma feroz declaração de não-compactuação com os padrões do Pop atual, perdido em clipes, programações eletrônicas simplistas e limitadas, dependente de vários fatores extra-musicais para existir.

Nada disso está no radar de Natalie. Ela escapa lindamente dessas armadilhas e confere um ar autoral/orgânico a suas canções que soa invejável. Peguemos, por exemplo, o single dourado Short Court Style, uma pequena abertura numa dobra espaço-tempo para algum lugar em que o Pop dança com o Soft Soul setentista num programa qualquer de mais tocadas do dia, que alguém ouve no carro a caminho de casa. Tudo é guitarrinhas em turbilhonamento, pianinhos subentendidos e arranjos de voz e cordas, com doçura suficiente para falar de empoderamento feminino. A voz é um caso à parte, com agudos precisos, lembrando grandes/pequenas cantoras do passado, como uma Minnie Ripperton, por exemplo. Mesmo com esta carga de referências “velhas”, a gravação e a alma da canção são totalmente 2018, de valorização de elementos realmente importantes/decisivos uma boa faixa pop, capaz de ter letra decorada, refrão cantado diante do espelho e ainda sobra espaço para alguém fazer um discreto air guitar. É um pequeno ticket para 3:44 minutos de felicidade.

Há outros momentos equivalentes por aqui. Sisters tem pegada elegante, com certo ar jazzístico em discretas intervenções de piano e backing vocals, resvalando para o R&B quando chega o refrão. Never Too Late é uma balada Soul Pop de primeira categoria, com uma linha de baixo proeminente e precisa, totalmente orgânica, resvalando num refrão que abre espaço para influências brasileiras de samba-jazz de gente grande, algo que poderia, sem exagero, estar num arranjo de Stevie Wonder. Ship Go Down é outra beleza de pianos e cordas, com pedigree que vai até os melhores trabalhos de Laura Nyro no início dos anos 1970. Para fechar o hall de influências douradas, Far From You tem Natalie com arranjo e doçura equivalentes aos de uma Karen Carpenter adolescente, ainda que seu registro vocal não tenha o mesmo alcance.

Voltando à primeira linha do texto, Natalie não só está madura já no segundo disco, como se configura numa das mais sensacionais cantoras de sua geração, com um trabalho que tem tudo para ultrapassar limites e atingir grande êxito. Um disco maravilhoso.

(The Future And The Past em uma música: Short Cut Style*)**

Loading

BOM PARA QUEM OUVE: Eleanor Friedberger, Jenny Lewis, Feist
ARTISTA: Natalie Prass
MARCADORES: Ouça, Pop Alternativo

Autor:

Carioca, rubro-negro, jornalista e historiador. Acha que o mundo acabou no meio da década de 1990 e ninguém notou. Escreve sobre música e cultura pop em geral. É fã de música de verdade, feita por gente de verdade e acredita que as porradas da vida são essenciais para a arte.