Resenhas

Paul McCartney – Egypt Station

Álbum revisita sua carreira e tenta acompanhar tendências atuais

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Ano: 2018
Selo: Capitol
# Faixas: 16
Estilos: Pop, Rock
Duração: 57:30
Nota: 4.0
Produção: Greg Kurstin, Ryan Tedder

Pois é, cá estamos nós diante de Paul McCartney, instituição viva e atuante da música Pop. Do alto dos seus 76 anos de idade, o artista chega a impressionante marca de 18 álbuns solo. Começaremos esse texto, portanto, dizendo o óbvio porém inevitável: Egypt Station evoca diversos momentos do seu passado artístico.

Para ficar em uma circunferência mais palpável e fazer a comparação com algo mais recente, é possível dizer que esse trabalho soa mais heterogêneo e texturizado que o seu antecessor New, já que traz dentro de si diversos estados de espírito. Seu nome, inclusive, vem para explicar, de maneira mais ou menos genérica, esse conceito: cada faixa equivale a uma “estação” imaginária, ou seja, pretende conduzir o ouvinte a um novo clima, um novo cenário, enfim, um novo microcosmo.

No entanto, por mais que mude de ideias ao longo do caminho, McCartney ostenta em Egypt Station um timbre de voz que só o peso do tempo pode dar a uma pessoa. Sua energia condiz com aquele princípio “caetanovelôsico” de que um artista contemporâneo, atualizado e interessante, é também um artista com tesão. E muito dessa energia energia vital vem na forma de metáforas sexuais nas letras, sim, mas vem muito também com um notável interesse por assuntos do nosso mundão atual. Da produção Pop Eletrônica às letras políticas, o artista encosta nos pontos de referência a partir dos quais grande parte da música gira hoje em dia.

Apesar disso, é engraçado notar que Egypt Station, quando se apega muito literalmente às tendências contemporâneas, escorrega. A faixa Fuh You – a única produzida por Ryan Tedder ao invés de Greg Kustin –, se faz notar como uma anomalia que salta aos ouvidos, destoa da assinatura de Macca e parece querer seguir tendências radiofônicas à força. Já no campo político, People Want Peace e Despite Repeated Warnings vêm com um arremate que parece inevitável nos dias de hoje, uma crítica de teor anti-Trump, mas de horizontes indefinidos e que parece ser uma carapuça feita para capturar a quem quer que ela sirva. Soa homogeneizador o esforço de nunca ultrapassar o consenso: um verso como “o povo quer paz”, por exemplo, ao menos para ouvidos brasileiros, vai provavelmente soar muito mais ingênuo do que apelativo ao nosso senso de comunidade (um “nanana” no refrão provavelmente cumpriria melhor esse trabalho).

O que vai realmente satisfazer o público em Egypt Station são os trejeitos musicais de McCartney que pulsam com uma força ancestral. Faixas como I Don’t Know, uma canção digna de um compositor-ourives, exibe uma melodia melancólica que desliza sobre uma estrutura de acordes que se encaixam milimetricamente uns nos outros. Outras, como Come On To Me, exibe uma aura quintessencial, com andamento mamútico e uma energia bufônica que não pede licença para passar.

Como quer que seja, Egypt Station não vem para angariar novos ouvintes – se, por algum acaso você nunca ouviu Paul McCartney antes, não é por aqui que você deve começar a entender sua importância – e sim para reforçar o laço sentimental de tanta gente que teve sua vida marcada pelo músico. Entre confissões pessoais do fundo do baú (Confidante) e canções de amor escritas pela cartilha (Hunt You Down/Naked/C-Link), Egypt Station vale seu investimento porque, mesmo com desvios de rota, exibe ao fundo essa jóia que é o senso melódico de McCartney, uma referência a partir do qual tudo se desenrola, configurando uma espécie de origem edênica da música Pop tal qual conhecemos hoje.

(Egypt Station em uma música: I Don’t Know)

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BOM PARA QUEM OUVE: Todd Rundgren, Paul Simon, Cat Stevens
MARCADORES: Pop, Rock

Autor:

é músico e escreve sobre arte